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Os atletas do 1.º Cross Country Nacional na linha de partida |
O
atletismo agrega a si um conjunto de disciplinas (ou modalidades) desportivas que
se constituem como o evento desportivo mais antigo que se conhece do mundo
civilizado. Criado na Grécia antiga, o atletismo foi a base da criação dos
jogos Olímpicos, em 776 a.C. . A
modalidade é composta por um total de 25 disciplinas, sendo uma delas a corrida
de Corta-Mato, ou como se chamava nos finais do século XIX e princípios do
século XX, Cross Country. Em Portugal as provas de Corta-Mato, ou de Cross-Country, como então se denominavam, constituem-se como a mais antiga
competição oficial do nosso atletismo, tendo sido criada em 1911, e é esse tiro
de partida que hoje vamos recordar no nosso Museu. Facto ocorrido em maio do citado ano, altura em que Lisboa - e arredores -
acolheu o 1.º Cross Country Nacional, ou na denominação atual, o 1.º Campeonato
Nacional de Corta-Mato. De acordo com Os
Sports Ilustrados, a principal revista desportiva da época, a primeira
corrida deste género realizada em solo nacional foi «brilhantíssima», deixando
as melhores impressões quer ao numeroso público que a ela assistiu, quer aos 48
atletas que em representação de 8 clubes marcaram presença no evento organizado
pela Liga Sportiva. Cada clube/equipa era formado por 6 atletas. Assim, deram vida a
este primeiro Cross Country Nacional o Benfica (cuja equipa era constituída por
Francisco Lázaro, Félix Bermudes, Augusto Fernandes, Germano de Vasconcelos,
Francisco Rocha e José Correia), o Sporting (que apresentou como atletas,
Amadeu Barros, Mathias de Carvalho, Augusto Barros, Guilherme Ribeiro, Joaquim
Pires, e Arnaldo Silva), o Clube Internacional de Football (cuja equipa era
formada por Plácido Duro, João Figueiredo, Armando Cortezão, MacCarthy, Heraldo
Ribeiro, e José Mascarenhas), o Sport Grupo e Progresso (composto pelos atletas
Augusto Jardim, João Guerreiro, Benjamim Jardim, António Ferreira, Álvaro de
Almeida, e José Caldas), o Atheneu Comercial (que apresentou os atletas Armando
Cruz, Homero Alves, António Montez, Alberto de Oliveira, José Trindade, e Ponte
Ferreira), o Sport Clube Império (cuja equipa era formada por Travassos Lopes,
Albino Abranches, Borja Santos, Miguel Simões, António Fernandes, e Theodoro da
Costa), o Ginásio Clube Português (cujo combinado era composto por Borges de
Castro, Pinto d' Almeida, José Carreira, José da Costa Brandão, José Ferreira
dos Santos, e Virgílio Gomes), e a Escola Académica (com António Ferreira
Coutinho, Heitor de Lemos, Heliodoro Monteiro de Castro, Henrique Drumond
Júnior, António Dias dos Reis, e João Guilherme Diniz).
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O Sport Clube Império, que venceu o 1.º lugar da classificação por equipas |
Entre
esta quase meia centena de corredores alguns nomes sonantes do (então)
atletismo luso disseram presente, entre eles o primeiro grande corredor português,
Francisco Lázaro, de quem aqui já falámos noutras viagens ao passado, e que viria a ser a grande estrela desta corrida. Augusto
Sabbo, árbitro da prova e um dos três elementos que juntamente com Cândido
Silva e João Lopes de Figueiredo compunham a comissão de sports athleticos da Liga Sportiva, deu o tiro de partida da
corrida às 11H30 debaixo de um calor abrasador, num percurso de 4,8 km. «Esta corrida, que deixou no espírito de
todos, tanto concorrentes, como espectadores, uma magnífica impressão, foi a prova cabal de
quanto valor teem os nossos pedestrianistas e de quanto seriam capazes de
fazer, se soubessem e quizessem treinar-se com rigor e methodo», escrevia a
reportagem d' Os Sports Ilustrados, a
qual vincava o esforço dos 48 sportsmen,
que debaixo de intenso calor mostraram uma força e uma energia que «só o portuguez sabe ter, ora saltando um obstaculo,
escarpando um monte, atravessando um campo de piso irregular ou lançando-se a
toda a velocidade por uma encosta abaixo. Corriam sempre, no desejo de
alcançarem uma boa colocação ou um bom logar na classificação final».
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A equipa do Sporting que foi 2.ª classificada |
O
sportinguista Mathias de Carvalho foi o primeiro a dar nas vistas, alcançando
com distinção o primeiro obstáculo da corrida, um monte. Só que ao trepar o dito
monte, que tinha ainda um pequeno charco para dificultar ainda mais a vida aos
atletas, despistou-se, e teve de voltar atrás - segundo as regras da prova -,
sendo alcançado pela dupla composta por Francisco Lázaro, e Augusto Fernandes,
que passaram a tomar a dianteira da corrida, seguidos de perto por
Mathias de Carvalho. Reza a crónica deste 1.º Cross Country Nacional que a luta
entre os três foi emocionante. «Os três
queriam o primeiro logar e a encosta que se seguia a esse monte, a azinhaga até
ao Campo Grande e a estrada do Campo à entrada da azinhaga dos Frades foi
percorrida pelos três, que já então se tinham distanciados dos restantes
concorrentes, n'uma lucta magnifica tomando a cabeça ora um ora outro. Essa
lucta emocionante prolongou-se até à méta de chegada que foi alcançada em
primeiro logar por Francisco Lázaro, do Sport Lisboa e Benfica, seguido de
perto de Augusto Fernandes, do mesmo clube, e Mathias de Carvalho, do Sporting
Clube de Portugal», assim relatava a reportagem da citada revista
desportiva.  |
A equipa do Benfica, onde pontificava o maior nome do atletismo nacional da primeira década dp século XX: Francisco Lázaro |
Francisco
Lázaro cortou a meta em primeiro lugar com o registo de 20'25'', tendo o
jornalista que eternizou nas esbatidas páginas d' Os Sports Ilustrados (cujo nome foi desconhecido) esta corrida, considerado este
desempenho como magnífico. A classificação por equipas foi feita depois de
terem sido recebidos todos os boletins dos árbitros da pista, que deram como
primeiro classificado, com 96 pontos, a equipa do Sport Clube Império que
recebeu assim a Taça Os Sports Ilustrados.
Em
segundo lugar por equipas ficou oi Sporting, que foi agraciado com a Taça da
Liga Sportiva, ao passo que o Benfica fechou o pódio. Seguiram-se as equipas do
Sport Grupo e Progresso (4.º), do Club Internacional de Football (5.º), do
Atheneu Comercial (6.º), do Ginásio Clube Português (7.º) e da Escola Académica
(8.º).
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Um momento da corrida |
A
reportagem dá ainda conta de que dos 48 participantes apenas um não finalizou a
corrida, por doença súbita. Os prémios deste 1.º Cross Country Nacional foram
entregues no dia seguinte à corrida, nas instalações do Ginásio Clube
Português, sendo que além das já referidas taças aos dois primeiros
classificados por equipas, a organização ofereceu um estojo de barbear, uma cigarreira
de prata, e um cinzeiro de cristal e prata aos dois primeiros classificados a
nível individual.