segunda-feira, 14 de abril de 2025
A rainha (Ticha Penicheiro) do basquetebol português subiu (há 20 anos) ao trono da WNBA
2025 marca igualmente o 20.º aniversário de um dos capítulos mais belos do basquetebol nacional, escrito por uma das suas mais virtuosas figuras, neste caso, Ticha Penicheiro. Nascida numa terra onde o basket é encarado com paixão, a Figueira da Foz, Patrícia "Ticha" Nunes Penicheiro foi um elemento preponderante na conquista da competição mais importante planetária do basquetebol feminino por parte da equipa dos Sacramento Monarchs em 2005. Falamos da WNBA (a NBA feminina). Ticha, foi nessa temporada a rainha das assistências da liga norte-americana e foi das mãos dela (num lance livre a 9 segundo do final) que surgiu o ponto decisivo para as Monarchs derrotarem por 62-59 as Connecticut Sun no jogo quatro da final disputada à melhor de cinco partidas e que carimbou o título. Foi a primeira vez que a equipa californiana, um dos oito conjuntos originais da Liga norte-americana desde o seu início em 1997, venceu a maior competição do basquetebol feminino do planeta. No regresso a Portugal após esta conquista, Ticha Penicheiro foi alvo de inúmeras homenagens, destacando-se a medalha de Honra e Mérito Desportivo atribuída pelo Governo português, que lhe foi entregue na sua terra natal pelas mãos do então secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Laurentino Dias. Já em 2021, ano em que a WNBA comemorava o seu quarto de século de existência, Ticha foi considerada uma das 25 melhores jogadoras dos 25 anos de história da WNBA (nota: a portuguesa é a única jogadora europeia presente nesta lista), sendo que dois anos antes havia sido integrada no Hall of Fame da competição. Além do título em 2005, a jogadora (nascida a 18 de setembro de 1974) somou vários títulos nacionais na Europa, nomeadamente em França, na Rússia e na Polónia, países onde atuou.
quarta-feira, 9 de outubro de 2024
1982: o ano em que o humilde Portugal abriu as suas portas à classe média do basket europeu
As décadas de 70 e de 80 do século passado foram de algum relevo para o basquetebol nacional, não só pelo facto de várias equipas lusas terem participado nas competições europeias, como também no aspeto da nossa seleção nacional ter medido forças com algumas potências do basket continental…. embora sem grandes resultados positivos alcançados. Este período coincidiu com o histórico acolhimento da 23.ª edição do Campeonato da Europa de seniores masculinos em 1982, naquele que se constituiu como o primeiro grande acontecimento basquetebolístico internacional ocorrido no nosso país. Competição essa que também era conhecida como Challenge Round, a Divisão B da modalidade a nível europeu. A prova desenrolou-se em maio de 1982 nas cidades de Lisboa e do Porto, sendo que na capital teve como palco o Pavilhão dos Desportos, ao passo que na Cidade Invicta os jogos disputaram-se no Pavilhão das Antas. 12 nações – a saber, Portugal, Roménia, República Federal da Alemanha (RFA), Inglaterra, Suécia, Finlândia, Hungria, Grécia, Turquia, Bulgária, Bélgica e Holanda – competiram no nosso país com os olhos postos ou na Divisão A do Europeu, ou na permanência nesta Divisão B, como era o caso de Portugal, que havia subido da Divisão C no ano anterior. Organizar um evento desta dimensão não foi pêra doce para a organização, desde logo pela falta de meios financeiros, conforme ficou vincado por Máximo Couto, o então presidente da Federação Portuguesa de Basquetebol (FPB), à Gazeta dos Desportos. Nessa entrevista, o dirigente assegurava que estava tudo preparado para o início do Europeu, pese embora alguns contratempos de última hora estavam a causar alguma apreensão organização. Desde logo a falta de apoios financeiros inicialmente prometidos e que à última a hora não se concretizaram, como foi o caso da televisão pública, que acabou por não transmitir todos jogos, o que fez com que a FPB perdesse uma boa receita financeira em termos de publicidade. Mas de igual modo, outras entidades estatais acabaram por retirar o prometido apoio financeiro a poucos dias do início da prova, o que causou, naturalmente, preocupação entre os dirigentes federativos. «Estou de certo modo muito preocupado com o aspeto financeiro do campeonato, se bem que neste momento não possamos voltar para trás. No final tudo se pagará, se bem que neste momento não se sabe muito bem como. Estamos a fazer tudo ao nosso alcance para que não haja prejuízo, mas o problema da televisão está a criar-nos dificuldades financeiras. No entanto, pensamos fazer mais receita, até porque os bilhetes são a um preço acessível, 100 escudos por sessão, que dá direito a ver três jogos, pelo que tanto no Porto, como em Lisboa, estamos esperançados que o público acorra, para ver bons espetáculos», perspetivou o dirigente.
Mas com maiores ou menores dificuldades lá foi ultrapassado este obstáculo financeiro, muito graças a diversos mecenas – vulgo patrocinadores/empresas– privados. E no plano desportivo a prestação lusa acabou por ser… tristonho! É, realmente a diferença do basquetebol que se jogava em Portugal em comparação com o resto da Europa fez-se notar na equipa orientada pelo selecionador Adriano Baganha. Mas já lá vamos a resultados concretos. Na partida para o Europeu havia muita confiança entre a delegação lusa, que esperava que o forte apoio do público a pudesse manter na Divisão B do Campeonato da Europa. Portugal reuniu alguns dos seus melhores basquetebolistas da época, desde logo aquele que ainda hoje é considerado como o maior jogador nacional desta modalidade, Carlos Lisboa. Então com 23 anos, Lisboa, que nessa temporada se tinha sagrado campeão nacional pelo Sporting, fazia-se acompanhar de outros craques. A saber, Augusto Baganha (Sporting), Rui Pinheiro (Sporting), Artur Leiria (Atlético), João Seiça (Atlético), Carlos Santiago (Atlético), João Cardoso (Sporting), Rui Pereira (FC Porto), Alberto Van Zeller (FC Porto), Eustácio Dias (Ginásio Figueirense), José Luís (Benfica), Tó Quintela (FC Porto), e José Paiva (Académico de Coimbra).
Integrada no Grupo A – sediado em Lisboa –, juntamente com as seleções da Suécia, RFA, Finlândia, Inglaterra, e Hungria, a seleção nacional mostrou na verdade que ainda tinha um longo caminho a percorrer para conseguir ombrear com seleções do nível intermédio do basket continental. Sim, nível intermédio, pois estamos a falar do Campeonato da Europa B, onde nem sequer estava a elite do basquetebol da Europa. E essa necessidade de aprendizagem ficou bem patente logo na estreia, diante da Suécia, em que Portugal desiludiu, de acordo com a reportagem da Gazeta dos Desportos. «Pode-se dizer que a estreia da equipa portuguesa no Europeu de 82 foi uma completa desilusão, não pela derrota em si, mas pela exibição, que no mínimo se deverá classificar de descolorida. Efetivamente a equipa portuguesa mostrou-se pouco esclarecida no ataque e a defender… bom, a defender não o fez. (…) A (não) defender os portugueses foram exímios, demonstrando à evidência todos os erros anteriormente (campeonato nacional, nomeadamente) demonstrados, desatenção aos cortes, recuperação (?) defensiva a passo, etc.». Resultado final: 88-82 a favor dos suecos. Com 28 pontos, Carlos Lisboa foi o melhor marcador luso no jogo de estreia. No encontro seguinte, diante dos alemães, os lusos até tentaram corrigir o mau arranque, pelo menos a julgar pelos minutos iniciais do encontro. Isto, se olharmos para o resultado de 10-9 a seu favor à passagem dos 5 minutos, o que terá causado algum espanto a quem presenciou o duelo. Porém, e com naturalidade, os alemães começaram a pouco e pouco a inverter o rumo dos acontecimentos, sem que, no entanto, Portugal os deixasse distanciarem-se no marcador. O final chegou com um triunfo da RFA por 92-80, mas acima de tudo deixou uma imagem muito mais positiva do selecionado português em comparação com a partida ante os suecos. Com 17 pontos na conta pessoal, Lisboa foi o melhor marcador da turma portuguesa ante a RFA.
A derrota mais pesada dos lusos neste Europeu de 82 aconteceu na 3.ª jornada, quando foram cilindrados pela Inglaterra por 107-90, o que definiu desde logo que a turma orientada por Adriano Baganha tinha obrigatoriamente de vencer os dois últimos jogos para se manter na Divisão B. Diante da Finlândia os portugueses voltaram a entrar bem no jogo. Porém, os nervos acabariam por falar mais alto, e uma «série de maus passes e lançamentos falhados por diversas ocasiões, nunca permitiu o nosso distanciamento no marcador (se bem que na segunda parte tivéssemos 10 pontos de avanço) e tornou possível que os finlandeses acabassem por vencer (por 81-77)», escrevia Cardão Machado, correspondente da Gazeta dos Desportos. Calos Lisboa foi mais uma vez o melhor marcador da seleção, com uns impressionantes 41 pontos.
E face a este resultado Portugal carimbava matematicamente a descida à Divisão C, o último escalão do basquetebol europeu, falhando assim o seu grande objetivo no torneio. (Nota: no último encontro da fase de grupos os portugueses conheceram a sua quinta derrota no torneio, desta feita diante da Hungria, por 92-70). Na hora de fazer um balanço da participação da equipa portuguesa, Cardão Machado escrevia que tinha sido «uma grande aventura, que como todas as aventuras, tem coisas boas e coisas más. No entanto, pensamos que apesar de a nossa equipa ter baixado de divisão, este campeonato tem muitas coisas positivas e tem muitas lições a extrair. (…) No aspeto organizativo a prova foi um êxito. As delegações estrangeiras estão satisfeitas e os comissários da FIBA nada têm a apontar, antes pelo contrário. (…) No que toca à parte financeira, e nesta altura, pode considerar-se um fracasso. Segundo informações que nos chegaram, as jornadas em Lisboa têm rendido à volta de 50 mil escudos, enquanto que no Porto têm andado por 8 mil escudos. Valeu, no entanto, as ajudas de algumas firmas particulares, caso da Fidelidade, Vimóveis, NCR, 3M de Portugal, e Toyota».
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Carlos Lisboa |
sexta-feira, 28 de junho de 2024
Efemérides (10)... Neemias Queta: o primeiro luso campeão da NBA
segunda-feira, 18 de setembro de 2023
O conto de fadas do pequeno Estrelas da Avenida escreveu-se há 25 anos
O que
para muitos seria impensável (ou não!) aconteceu há precisamente 25 anos no
universo do basquetebol nacional. Um pequeno clube lisboeta surpreendeu (ou
não, lá está) o país basquetebolístico ao fazer a dobradinha na temporada de
97/98. Por outras palavras, sagrou-se campeão nacional e venceu a Taça de
Portugal, os dois principais troféus do basket português. E este feito ainda
hoje tem contornos de conto de fadas se atendermos ao facto de ter acontecido
numa altura em que o Benfica, por exemplo, vivia o seu melhor período da
história no âmbito desta modalidade, já que entre 1988 e 1995 havia sido sete
vezes consecutivas campeão nacional sob a batuta de lendas como Pedro Miguel,
Jean-Jacques, Carlos Seixas, Steve Rocha, ou o imortal Carlos Lisboa; mas
também num período que via renascer o FC Porto como um gigante da modalidade,
visto que nas duas temporadas anteriores a 97/98 os portistas interromperam o
reinado benfiquista no que diz respeito ao campeonato nacional.
Não se pense, porém, que este pequeno clube da capital era um pobre coitado no então panorama do basquetebol português, nada disso, já que partiu para 97/98 nas asas de um grupo forte, talentoso, experiente e capaz de bater o pé a muito boa gente. Mas seria isso suficiente para alcançar o brilharete alcançado? Pelos vistos foi.
Esta introdução serve para recordar a epopeia do Centro Recreativo Estrelas da Avenida, que em 97/98 escreveu a sua página de (maior) glória. Clube com fortes tradições no basquetebol, o Estrelas da Avenida concretizou na referida época a "ameaça" que vinha fazendo nos anos anteriores, ou seja, inscrever o seu nome no palmarés das principais competições nacionais. A primeira tentativa de o fazer havia sido em 85/86 quando o Estrelas, então na 2.ª Divisão Nacional, caiu aos pés do FC Porto na final da Taça de Portugal, por 119-76, numa final disputada em Coimbra. Uma temporada mais tarde o Estrelas da Avenida sobe à 1.ª Divisão Nacional e por uma "unha negra" não vence o título do segundo escalão, sucumbindo às mãos do Esgueira. Esta subida ao patamar mas elevado do basket nacional era então o maior feito de um clube que havia sido fundado apenas cerca de 10 anos antes - mais concretamente em abril de 1976 - e com apenas 600 associados! Rapidamente o clube da freguesia da Penha de França tornou-se querido e popular entre os lisboetas... e apetecido para muitos basquetebolistas de renome prosseguirem a sua carreira fora do "circuito" dos grandes clubes nacionais. Na entrada para os anos 90 o Estrelas consolidou-se como um clube de "primeira" (divisão) e passo a passo foi rumo ao sonho concretizado em 1998. E para agarrar o sonho o Estrelas da Avenida foi comandado por aquela que é provavelmente a melhor dupla de treinadores da história do basquetebol nacional, composta por Mário Palma (treinador-principal) e Mário Gomes (treinador-adjunto). Ambos tinham conduzido o Benfica à glória ao longo das seis temporadas anteriores. Tecnicamente bem comandado o clube da Penha de França contou nessa temporada, e como já referimos, com nomes sonantes do basket nacional, casos de Henrique Pina (base), Artur Cruz (extremo/poste), ou o brasileiro Flávio Nascimento (extremo), três nomes que enquanto antigos jogadores do Benfica comandado por Mário Palma haviam tido a experiência de ser campeões nacionais da 1.ª Divisão. A estes nomes juntavam-se, por exemplo, os espanhóis Joaquín Arcega (base/extremo) e Juan Barros (extremo/poste), que traziam consigo a qualidade do competitivo a nível internacional campeonato de Espanha, quiçá já então o melhor campeonato nacional a nível europeu. Além disso, qualquer equipa de basket que se preze tem de ter pelo menos um atleta norte-americano nos seus quadros para conferir qualidade e competitividade, ou não fosse os Estados Unidos da América a potência mundial do basket. Pois bem, o Estrelas da Avenida de 97/98 tinha três artistas norte-americanos de "primeira água", casos de Doug Muse (poste), Terrence Rayford (poste), e Wayne Englestad (extremo/poste). A estes nomes juntam-se os de Daniel Guedes (base), Arlindo Neves (base), Luís Simão (extremo), Roberto Silva (extremo), Alex Bento (base), Paulo Agostinho (extremo/poste), Paulo Simão (base/extremo) e Bruno Trinchante (extremo/poste), e eis que estamos perante o plantel que conduziu o Estrelas da Avenida à glória.
Em termos mais concretos, o emblema lisboeta fez uma fase regular do campeonato nacional absolutamente brilhante, terminado esta primeira etapa no 3.º lugar, com 20 vitórias e 6 derrotas, e com 46 pontos, os mesmos que o segundo colocado e campeão nacional em título, o FC Porto, e apenas a um do primeiro classificado, a Oliveirense. Atrás do Estrelas vislumbravam-se potências do basquetebol nacional de então, casos do Benfica, da Portugal Telecom, ou da Ovarense. E seria precisamente diante de um projeto que viria dar frutos (títulos) nos anos seguintes que o Estrelas da Avenida deu início à sua caminhada na fase dos play-off. O clube da Penha de França vence a Portugal Telecom nos quartos de final desta fase a eliminar e marca encontro com o FC Porto na ronda seguinte. E o que se viu foi o campeão nacional em título vergar-se à magnífica equipa lisboeta, que no quinto e decisivo jogo da eliminatória venceu em Almada (a sua casa ao longo deste trajeto de glória) por 77-70, assegurando assim a presença na final do campeonato.
Por esta altura, já muitos apontavam o Estrelas da Avenida como sério candidato ao título, já que no meio da eliminatória com os portistas os pupilos de Mário Palma haviam conquistado a Taça de Portugal, após derrotarem o Benfica por 87-86. Na final da 49.ª edição da taça, realizada no Pavilhão do Seixal, o Estrelas saiu para o intervalo em desvantagem, por 38-45, mas uma sensacional recuperação no segundo tempo assegurou a conquista do primeiro título de cariz nacional para o emblema da Penha de França. E seria pois com a moral em alta que os rapazes de Mário Palma chegaram à final do campeonato nacional, onde teriam como opositores a Ovarense. E tal como na meia-final dos play-off foi necessário um quinto e decisivo jogo para encontrar o campeão nacional, partida essa que o Estrelas iria vencer por 71-63 e carimbar assim o título. A partida decisiva foi disputada num Pavilhão de Almada completamente cheio, que testemunhou a conclusão de uma época de ouro para o emblema da capital. O Estrelas da Avenida que até entrou melhor nesta eliminatória final, conquistando duas vitórias nos dois primeiros jogos. Porém, a perda de uma das suas unidades mais influentes, o norte-americano Wayne Englestad, que acusou positivo num controlo anti-doping, fez a equipa de Mário Palma quebrar nos dois encontros seguintes, como se comprovam as vitórias da Ovarense e o consequente empate na eliminatória. Porém, na "negra" o Estrelas foi a equipa mais serena, menos tensa e que aguentou melhor a pressão, nas palavras do técnico Mário Palma, que desta forma vencia o seu sexto título de campeão nacional. "Ao longo da época fomos a melhor equipa", dizia Palma no rescaldo desta grande fábula em que David venceu (vários) Golias.
terça-feira, 5 de julho de 2022
A primeira digressão internacional dos Harlem Globetrotters teve Portugal como ponto de partida
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Harlem Globetrotters atuando no Porto ante o Vasco da Gama |
E
quis o destino que Portugal fosse o primeiro país a receber os magos, ou
ilusionistas, se preferirem, do basket planetário.
Estávamos em maio de 1950 quando os melhores basquetebolistas do Mundo
aterraram no nosso país para aqui iniciarem uma digressão que iria durar até
1962! Estava assim colocada em marcha a ideia do inglês Abe Saperstein, o
proprietário dos Harlem Globetrotters, que quis conquistar o mercado europeu
através desta equipa que nasceu oficialmente em Chicago no ano de 1927, e que
tinha como característica distintiva o facto de ser composta exclusivamente por
jogadores negros excluídos das ligas profissionais. Nesta altura a fama dos
jogadores afro-americanos que exibiam os seus dotes de basquetebolistas nos playgrounds - quadras de rua - norte-americanos,
sobretudo na região de Nova Iorque, era enorme, sendo ali criado um festival de
verão organizado pelo bairro negro de Harlem, que se viria a tornar extremamente
popular em todo o país com o passar dos anos. Nesse sentido, Abe Saperstein
escolheu esse nome para a sua equipa, para indicar claramente que se tratava de
um conjunto formado por atletas negros, e que seriam uma espécie de globetrotters, isto é, que jogariam por
todo o território dos Estados Unidos da América, o berço do basquetebol.
Durante suas viagens, os Harlem Globetrotters demonstraram sistematicamente a sua
superioridade sobre os conjuntos compostos por atletas brancos, sendo que a
título de exemplo, em 1948 e 1949, venceram por duas ocasiões os Minneapolis
Lakers, que eram nada mais nada menos do que os campeões da mais famosa liga de
basquetebol do Mundo, a National
Basketball Association (NBA).
A
presença dos mágicos do basket
norte-americano mereceu, como é óbvio, redobradas atenções por parte da imprensa
nacional, em especial da desportiva, que escreveu algumas páginas sobre esta
(hoje) histórica visita. Para muitos parecia um sonho, como escreveu o
jornalista Rodrigues Teles, na revista Stadium.
O sonho de ver os melhores basquetebolistas do Mundo a atuar no nosso país, um
sonho que na verdade se viria a tornar em realidade. «Os americanos do basquetebol, os americanos brancos e os americanos
pretos, que nos maravilharam através de uma curiosa exibição cinematográfica,
apresentaram-se entre nós, "carne e osso", e demonstraram-nos que
todas as suas fantasias são deste Mundo, que não há o mínimo exagero no que
vimos no "ecran". Foram tudo - e mais alguma coisa ainda. Talvez o
verdadeiro amador do basquetebol puro, embora gostando muitíssimo do malabarismo
e da arte americana, achasse que o espectáculo "era mais de circo".
Talvez. Quanto a nós, porém, o eapectáculo de que foram especiais comparsas os
negros dos Harlem Globe Trotteres, revelou-nos a excepecional categoria destes
atletas, o apuro extraordinário a que chegaram, a maneira simples como enfeitam
uma jogada - fazendo desporto».
A
vinda dos norte-americanos a Portugal não se restringiu à capital, já que
também o Porto (onde enfrentaram um seleção do norte e o Vasco da Gama) e
Coimbra ficaram deslumbrados com o virtuosismo dos Harlem Globetrotters, que se faziam acompanhar
nesta tourné pela equipa dos All Stars of America.
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Os astros norte-americanos em Portugal |
O
jornalista dava ainda conta que a vinda destes astros a Portugal havia resultado de um convite do Sporting, que se
associou ao Vasco da Gama (do Porto) e da Académica de Coimbra para organizar
os jogos/exibições nas três urbes portuguesas.
Tempo
houve ainda para Rodrigues Teles trocar algumas palavras com os malabaristas do
basquetebol, como lhes chamou, no sentido de os conhecer um pouco melhor.
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Marques Haines, luso-americano dos Harlem |
quarta-feira, 22 de setembro de 2021
Flashes Biográficos (16): Neemias Queta - O primeiro português a pisar o palco da galática NBA
O poste português nascido a 13 de julho de 1999 foi escolhido na posição 39 do draft pelos Sacramento Kings. Com 2,13 metros de altura, o atleta cresceu no Vale da Amoreira, começou a jogar no Barreirense, passou pelo Benfica, brilhou nas seleções jovens de Portugal, no basket universitário dos Estados Unidos da América e é assim o primeiro luso a jogar na melhor liga de basquetebol do mundo. É um sonho tornado realidade, não só para ele mas também para todos os amantes da modalidade nascidos em solo lusitano. Recorde-se que João “Betinho” Gomes participou no draft de 2007, mas a sorte não lhe sorriu, ao contrário de Neemias que na madrugada de 29 de julho de 2021 foi eleito na segunda ronda do draft.
Neemias Queta e "Betinho" Gomes são
dois atletas formados no Futebol Clube Barreirense que simbolizam o que de
melhor se faz nos escalões de formação do clube.
Neemias Queta chegou ao Barreirense aos 10 de idade, começando a praticar minibasquetebol. No Barreiro permaneceu até aos 19 anos, sendo que com 17 anos já representava a equipa sénior, passando dois anos depois para o Benfica, clube que representaria em apenas dois jogos pela equipa principal antes de viajar até aos Estados Unidos da América (EUA). Ali chegado ingressou na universidade de Utah State, onde atuou durante três temporadas ao serviço da equipa de basquetebol 'Aggies'. Na última temporada ao serviço dos ‘Aggies’, Neemias disputou 29 jogos, onde registou 433 pontos, 294 ressaltos, 77 assistências, 31 roubos de bola e 97 desarmes de lançamento. Um registo assombroso, e para se perceber a importância destes números temos de sublinhar que em 18 temporadas apenas dois jogadores conseguiram números superiores a 400 pontos, 50 assistências e 80 desarmes de lançamento, Neemias e Anthony Davis, sendo que este último é uma das estrelas atuais da NBA. Três anos depois de trocar Portugal pelos EUA, o jovem descendente de pais guineenses cumpre assim o sonho de chegar ao melhor campeonato de basquetebol do mundo. «Mal posso esperar por ir para Sacramento. Vamos, Kings!», escreveu o internacional luso na sua conta oficial na rede social Instagram assim que foi selecionado. Neemias é internacional pelas seleções jovens de Portugal, país que representou o EuroBasket Sub-18 de 2017, onde os lusos estiveram em bom plano e onde Queta se exibiu a um grande nível, de tal forma que essa boa performance lhe valeu a tal ida para os Estados Unidos. Em 2019 ajudou a nossa seleção a sagrar-se campeã do Europeu B da categoria de sub-20, tendo sido eleito para o cinco inicial do torneio.
Do Vale da
Amoreira para a NBA, este é um sonho que ainda só agora começou.