Taça Império |
1944 é
um ano marcante não só na história do futebol português como na história do
desporto lusitano de uma forma geral. A 10 de junho desse ano eram oficialmente
abertas as portas daquela que ainda hoje é considerada a mais emblemática sala
de visitas do desporto de Portugal, o Estádio Nacional. Uma obra - à época -
majestosa, que colocava a nação lusa em pé de igualdade com as maiores
potências europeias de então, no que dizia respeito a infraestruturas
desportivas modernas e de grande dimensão. Uma obra que teve o cunho do Estado
Novo, nascida no berço da ditadura salazarista e cuja idealização remontou a
1933, altura em que na sessão de encerramento do Congresso dos Clubes
Desportivos o presidente do Conselho, Oliveira Salazar, vincaria a importância do
desporto enquanto veículo de educação da juventude com vista «ao crescimento de
uma raça forte e sã que pudesse vir a defender o seu país».
Concluída
essa sua visão deixaria no ar uma promessa aos desportistas lusos: a construção
de um Estádio Nacional! Um ano depois foi lançado o concurso para a edificação
da catedral do desporto português, ficando definindo que esta seria erguida no
Vale do Jamor e iria contemplar não só um moderno estádio como também um vasto
leque de outras infraestruturas desportivas. O pontapé de saída na empreitada -
projetada por (Eng.) Duarte Pacheco - foi dado em 1939, sendo que o apito final
ocorreu cinco anos volvidos. Para a inauguração da obra uma pomposa festa foi
agendada então para o dia 10 de junho de 1944, naquela que se constituiu como
uma das maiores manifestações populares promovidas pelo Estado Novo e onde na
qual marcaram presença cerca de 80.000 pessoas. Densa massa humana que
preencheu as bancadas do imponente recinto que ali se inaugurava e que
testemunhou o vasto programa festivo desenhado para celebrar a efeméride,
programa esse pautado - sobretudo - por inúmeros desfiles de desportistas
oriundos de inúmeras representações nacionais da Mocidade Portuguesa.
Um dos muitos desfiles que ocorreram no dia da inauguração do Estádio Nacional |
Porém,
o ponto alto da cerimónia foi protagonizado pelos dois mais laureados clubes da
capital, Sporting e Benfica, emblemas que disputaram um sempre animado e
intenso duelo futebolístico. Os leões subiam ao recém inaugurado tapete verde
do Estádio Nacional na qualidade de campeões nacionais, ao passo que as águias
o faziam enquanto detentores da Taça de Portugal. O prémio para o vencedor
deste capítulo do dérbi eterno seria atribuído em dobro, isto é, o clube que
chegasse ao fim na frente do marcador levaria para casa dois troféus, a Taça
Império, instituída pela Federação Portuguesa de Futebol, e a Taça Estádio,
oferecida por Salazar para celebrar a ocasião.
E eis que a bola começa a rolar
perante o olhar das bancadas que fervilhavam de entusiasmo. O Benfica teve um
ligeiro ascendente no início do encontro, mas seria o Sporting a abrir o
marcador quando estavam decorridos 10 minutos por intermédio do feroz leão
Fernando Peyroteo, que assim batia pela primeira vez naquela tarde festiva o
guardião Martins, escrevendo desde logo uma página na história do desporto
nacional, e muito em particular do futebol luso, já que dos seus pés havia
saído o primeiro de muitos remates certeiros que seriam desenhados no mítico
palco.
Já no segundo tempo Espírito Santo empataria a contenda, oferecendo
desta forma aos presentes mais 30 minutos suplementares de futebol. Quase logo
após o pontapé de saída do prolongamento Peyroteo voltou a fazer estragos na
área encarnada ao fazer o seu segundo golo da tarde. Tento que animou os leões,
que embalados chegariam ao 3-1 por intermédio de Eliseu. Julinho ainda iria
reduzir para o Benfica, um golo que seria insuficiente para impedir a vitória
sportinguista por 3-2. Nesse encontro as equipas alinharam com: Sporting - Azevedo,
Manecas, Canário, Álvaro Cardoso, Barrosa, Eliseu, Mourão, António Marques,
Peyroteo, Cruz e Albano. Benfica - Martins, César Ferreira, Carvalho, Jacinto,
Albino, Francisco Ferreira, Espírito Santo, Arsénio, Julinho, Jaime e Rogério.
Uma vista panorâmica do duelo entre Sporting e Benfica no dia 10 de junho de 1944 |
O
Sporting arrecadava os dois troféus em disputa e mostrava o porquê de ser a
melhor equipa do futebol português daquele tempo. Este simples jogo de futebol
- e apontamento principal do cartaz festivo de propaganda fascista daquela
tarde de junho de 44 - acabaria por servir de inspiração aos responsáveis
vindouros do futebol português, os quais cerca de três décadas mais tarde se
basearam nele para criar a terceira competição futebolística de maior
importância do futebol português: a supertaça. Prova esta que desde 1979 é
disputada pelo campeão nacional e pelo vencedor da Taça de Portugal, e que
desde 1981 passou a chamar-se Supertaça Cândido de Oliveira, em homenagem a um
dos maiores vultos da história do futebol em Portugal, precisamente o mestre
Cândido de Oliveira.
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