terça-feira, 30 de julho de 2024

Bronze (inesperado) na casa de partida das Olimpíadas

No berço (Atenas) dos Jogos Olímpicos, Portugal conquistou em 2004 três medalhas. Em termos mais precisos, a delegação lusa presente na capital grega arrecadou duas medalhas de prata (por intermédio de Francis Obikwelu – no atletismo – e de Sérgio Paulinho– no ciclismo) e uma de bronze. É esta última que hoje iremos recordar em breves linhas e que foi conquistada por um dos melhores atletas da sua geração, Rui Silva. Nascido em Santarém a 3 de agosto de 1977, o corredor teve a sua estreia olímpica em Sydney, no ano 2000, onde não foi muito feliz a julgar pelo modesto 13.º e penúltimo lugar na prova dos 1500m em atletismo. Este resultado aquém do esperado não esmoreceu o atleta, que um ano depois se sagrava campeão do Mundo nos 1500m em pista coberta, numa competição realizada em Lisboa. Porém, o azar perseguiu o atleta nos anos seguintes, e antes de Atenas teve uma hérnia inguinal que lhe trouxe muitos problemas na preparação para os Jogos, pelo que o objetivo de uma medalha poderia passar por ser encarado de forma excessivamente otimista. No entanto, Rui Silva partiu para os Jogos de 2004 disposto a fazer um pouco melhor do que em Sydney, e a crença, e acima do tudo, o esforço em atingir essa meta ficaram bem patentes nas primeiras eliminatórias e na meia final dos 1500m, em que o atleta conseguiu gerir da melhor maneira o esforço e a sua condição física e dessa forma atingir a final. E no momento decisivo da prova dos 1500m o português fez uma prova espetacular. Estrategicamente começou a corrida ocupando os últimos lugares. Esperou pela última volta para atacar com toda a sua força, arrancando de forma fulgurante no ataque aos lugares da frente, passando pelo espanhol Reyes Estevez e por vários atletas africanos que à partida eram tidos como favoritos à conquista das medalhas. Da legião africana presente nesta final apenas o queniano Bernard Lagat e o marroquino Hicham El Guerrouj não se deixaram ultrapassar por Rui Silva. Os últimos 400m da corrida foram assombrosos para o luso, que acabaria por cortar a meta em 3.º lugar com um tempo de 3:34.18. O queniano Bernard Lagat terminou em segundo lugar com um registo de 3:34.30, ao passo que a medalha de ouro seria conquistada pelo marroquino El Guerrouj, com a marca de 3:34,19. Mas o foco da nação portuguesa estava, naturalmente, em Rui Silva, que conquistava a medalha de bronze, naquele que foi um dos pontos mais altos da sua laureada carreira, onde figuram, por exemplo, as medalhas de ouro dos 1500m nos campeonatos europeus de pista coberta em 1998 (Valência), 2002 (Viena) e Turim (2009).

segunda-feira, 29 de julho de 2024

Memórias da campeã olímpica Fernanda Ribeiro em exposição

No dia em que tiveram início os Jogos Olímpicos de Paris, 26 de julho, um espaço comercial localizado na Maia inaugurou uma exposição sobre a Fernanda Ribeiro, uma das atletas mais mealhadas da história do desporto em Portugal, e que nas Olimpíadas de 1996 conquistou uma medalha de ouro para o nosso país. Na mostra pudemos ver alguns objetos pessoais da coleção particular de Fernanda Ribeiro, como por exemplo, o equipamento (camisola, calção e sapatilhas) com que venceu a medalha de ouro olímpica em 1996; o dorsal 3643 que a atleta usou nessa epopeia em Atlanta; um pedaço da pista de tartan do Estádio Olímpico de Atlanta; os fatos de treinos usados nos Jogos Olímpicos de 2000, em Sydney, onde conquistou a sua segunda medalha olímpica, no caso, a de bronze; e algumas das mais importantes medalhas conquistadas ao longo da sua carreira, desde logo , o bronze olímpico de Sydney. A exposição contava ainda com vários painéis ilustrados com capas e notícias publicadas em jornais com alguns dos principais feitos nacionais e internacionais da atleta nascida em Penafiel. Uma simples, pequena, mas deveras interessante exposição desta lendária campeã olímpica lusa.


quinta-feira, 25 de julho de 2024

Um salto dourado para a glória olímpica

Um salto de 17,67m em direção à glória olímpica, o mesmo será dizer ao ouro, e que valeu a Nélson Évora um lugar (eterno) no Olimpo dos Deuses do Desporto. Estávamos em 2008, e Pequim recebia os Jogos da XXIX Olimpíada, para os quais a delegação portuguesa partia com algumas aspirações na conquista de medalhas. Uma das principais esperanças recaia em Nélson Évora, que um ano antes nos Mundiais de Osaka sagrou-se campeão do Mundo de triplo salto, com a marca de 17,74m, além de outro 1.º lugar na Taça da Europa desta disciplina do atletismo. Nascido a 20 de abril de 1984, em Abidjan (Costa do Marfim), Nélson Évora era filho de um cabo-verdiano e de uma marfinense, tendo com apenas 5 anos de idade vindo viver para Portugal, para Odivelas, mais em concreto. Em 2002, já com 18 anos, naturalizou-se português. Até Pequim colecionou inúmeros títulos (nacionais e internacionais), estabeleceu recordes, mas o ouro olímpico foi o ponto alto da sua carreira, naquela que foi a sua segunda participação em Jogos Olímpicos. Em 2004 tinha estado em Atenas, e com apenas 20 anos teve uma participação discreta no triplo salto, não tendo ido além do 40.º lugar na classificação final. Atenas serviu de aprendizagem a Nélson, que 4 anos volvidos era já um nome sonante do triplo salto internacional, e foi com esse rótulo que chegou à capital da China. 21 de agosto de 2008 é assim um dia histórico para o desporto nacional. Nélson Évora alcança a final do triplo salto. Entra da melhor forma no concurso, alcançando a marca dos 17,31m, apenas suplantada pelo seu maior concorrente nesta corrida ao ouro, o britânico Phillips Idowu, que saltou 17,51m. O terceiro salto do português foi nulo, e o britânico aproveitou para elevar a fasquia, isto é, melhorar o registo, para os 17,62m. Idowu começou a vibrar no Estádio Olímpico, ao persentir que o ouro estava cada vez mais perto, uma atitude que de certa forma espicaçou Évora, que olhando para a bancada na direção do seu amigo e treinador, João Granço, pareceu dizer que “isto ainda não acabou”. E eis como que a abençoar o quarto ensaio do atleta português, a chuva voltava a cair sobre Pequim nesse dia, um cenário que em jeito de premonição já tinha sido traçado pelo treinador João Granço, que antes de entrar no estádio virou-se para o seu pupilo e disse com convicção: «Hoje está a chover, mas vais ser campeão olímpico». Dito e feito. Nélson Évora projeta o corpo para a marca dos 17,67m, suplantando assim o registo do atleta britânico e passa para a liderança do concurso final de triplo salto. Idowu voltou à pista para tentar recolocar-se na liderança, mas já sem a força anímica com que iniciou a final não consegue ir além dos 17,26m e dos 16,41m nos seus dois últimos ensaios. Significou isto que a medalha de ouro era de Nélson Évora e de Portugal, país que 12 anos depois voltava a conquistar o ouro olímpico, depois de Fernanda Ribeiro o ter arrecadado em Atlanta 96. Curiosamente, tanto Fernanda Ribeiro como Nélson Évora foram os porta-estandarte da deleção portuguesa nos Jogos Olímpicos de 1996 e de 2008, e ambos trouxeram para casa o ouro.

sexta-feira, 19 de julho de 2024

A prata olímpica conquistada para Portugal pela filha do Velho Lau

“Filho de peixe sabe nadar”, uma expressão popular que pode ser aplicada nesta memória olímpica, que alude à conquista da medalha de prata no triatlo por parte de Vanessa Fernandes, filha de um grande campeão das duas rodas (vulgo, ciclismo), de seu nome Venceslau Fernandes. Nascida a 14 de setembro de 1985, em Vila Nova de Gaia, a filha do Velho Lau – como era conhecido este ciclista luso dos anos 70 e 80 –  viveu o seu momento de glória enquanto triatleta nos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008, quando trouxe para Portugal uma medalha de prata. Puxando um pouco a fita atrás, é de recordar Vanessa Fernandes iniciou a prática de natação aos 6 anos de idade, sendo que aos 13 inicia a prática de atletismo no FC Porto, ao passo que um ano depois junta a estas duas modalidades o ciclismo e dá início ao seu trajeto de glória no triatlo (modalidade que agrega natação, ciclismo e atletismo). A primeira grande conquista acontece já no novo milénio, em 2001, quando se sagra vice-campeã da Europa de juniores em duatlo (atletismo e ciclismo), para no ano seguinte arrecadar duas medalhas de bronze nos Europeus de juniores de duatlo e de triatlo. O nome de Vanessa Fernandes começou a ser falado de forma mais regular nos quatro cantos do país, e não só, em 2003, altura em que é campeã da Europa de juniores de triatlo. Passa de promessa a certeza da modalidade. Em 2004, vence novamente o Campeonato da Europa de triatlo, desta feita na categoria Elite, numa prova realizada em Valência; e no escalão de sub-23, em competição realizada na Hungria. É neste ano de 2004 que tem a sua primeira aparição olímpica, nos Jogos de Atenas, onde alcança um 8.º lugar na prova de triatlo. Até aos Jogos seguintes, dali a quatro anos em Pequim, soma inúmeras vitórias nacionais e internacionais (com destaque para uma série de 12 vitórias consecutivas em etapas da Taça do Mundo de triatlo), sendo por esta altura considerada a melhor atleta do circuito mundial da modalidade. Em 2007 é campeã mundial de triatlo (em Hamburgo) e de duatlo (em Gyor). É, pois, com um elevado estatuto que chega a Pequim, em 2008, para a sua segunda Olimpíada, partindo como uma das principais favoritas à conquista do ouro olímpico. A prova feminina de triatlo realizou-se numa manhã escaldante, numa localidade situada a 30 km de Pequim. Vanessa usava o dorsal número 54, e de pronto atira-se à água com uma vontade férrea de conquistar uma medalha para Portugal. Na prova de natação, que teve um percurso de 1,5 km, a portuguesa teve um forte arranque, colando-se de pronto ao grupo da frente. Termina este primeiro teste na 11.ª posição, e de pronto pega na bicicleta para dar início à prova de ciclismo, que tinha um percurso de 40 km. Tal como na natação, o arranque de Vanessa Fernandes foi forte, chegando mesmo a estar na liderança da corrida, fazendo a transição para a prova de atletismo no 9.º lugar da classificação geral. Na corrida de 10 km, a portuguesa correu a um ritmo alto, atacando as atletas que seguiam à sua frente, e com passada largas começou a distanciar-se de “uma atrás de outra”. Com a meta à vista, Vanessa Fernandes ganhou uma energia renovada e chegou ao fim no 2.º lugar, com o tempo de 1h59m34s, sendo apenas superada pela australiana Emma Snowsill, a campeão olímpica, com um registo de 1h58m27s. Cansada, mas feliz, era assim que a vice-campeã olímpica - e por consequência medalha de prata - Vanessa Fernandes se apresentou no pódio, sublinhando à comunicação social que tinha mostrado (um pouco) aquilo que valia. «O pódio era o meu objetivo, mas sei que valho mais do que fiz nesta prova. Sei que foi um feito grande», disse. E foi, de facto, como mais tarde comprovou a sua chegada a Portugal, em que na companhia do seu pai foi recebida em apoteose por milhares de portugueses no Aeroporto de Lisboa. 

terça-feira, 2 de julho de 2024

O FC Porto de Vítor Hugo eclipsou o poderoso Sporting de Livramento na primeira final internacional 100% portuguesa

Com o aparecimento das competições europeias de hóquei patins na segunda metade dos anos 70 do século passado, foi com naturalidade que os clubes portugueses começaram a enriquecer os seus currículos a nível internacional no seio da modalidade. Ou não fosse Portugal uma das maiores potências do hóquei sobre rodas. No início da década de 80 já o país tinha nas suas vitrinas as três principais taças europeias à época, nomeadamente a Taça dos Campeões Europeus (conquistada pelo Sporting em 1977), a Taça CERS (arrecadada em 1981 pelo Sesimbra) e a Taça das Taças (à conta do Oeiras em três ocasiões – 1977, 1978 e 1979 – e do Sporting, em 1981). E eis que na temporada de 81/82 dá-se um momento até então inédito no hóquei patinado luso: o facto de uma final europeia ser disputada por duas equipas nacionais. Pois bem, o detentor do troféu, o Sporting, tentava segurar o título diante do FC Porto, numa dupla final, isto é, jogada a duas mãos, que ficou nos anais da história da modalidade, como iremos perceber nas próximas linhas à boleia da Gazeta dos Desportos. Orientado pela lenda do hóquei planetário António Livramento, o Sporting entrou a todo o gás no rinque no jogo da primeira mão da final, realizado no Pavilhão das Antas, com 6000 espectadores nas bancadas. Logo aos 2 minutos, Sobrinho sticou com êxito para o fundo da baliza de Domingos, perante a euforia de Livramento, que do banco incentivava a sua rapaziada com gritos de que estes iriam vencer aquele encontro. 

Livramento passa o trono a Vítor Hugo

Puro engano. Três minutos volvidos começou o recital portista, com Vítor Hugo a assumir o papel de maestro. O número 4 do FC Porto fez o empate, a partir dali a turma da casa contrariando as expectativas iniciais – que davam favoritismo aos lisboetas – partiu para uma exibição de gala, arrebatadora, expressa em números volumosos: 13-4 a favor dos azuis e brancos. Nem o recém-eleito presidente portista, Jorge Nuno Pinto da Costa, esperava um score tão dilatado antes da partida, ele que antes
da sticada inicial vaticinou que o seu clube iria vencer por 3 golos de diferença. Olarilolé, quais 3 golos de diferença? Foram 9 e podiam ter sido mais, visto que o Sporting não mostrou talento, imaginação, força física, velocidade e frieza nos poucos lances perigosos que construiu, segundo a análise do jornalista da Gazeta que presenciou o encontro, Eugénio Queirós. «A verdade, verdadinha, é que os campeões nacionais e detentores da taça (das taças) tiveram um adversário que não contavam (?) à partida. Esse puto, ou antes, esse senhor, foi Vítor Hugo», escrevia o jornalista para apresentar a grande estrela deste encontro da 1.ª mão da final, precisamente Vítor Hugo, que só à sua conta apontou 7 dos 13 golos portistas, tendo os outros sido da autoria de Alves, Vale (3), e Vítor Bruno (2). O FC Porto na primeira metade deixou algum espaço de manobra aos leões, contra-atacando com uma rapidez estonteante, o que fez com que os golos fossem surgindo em catadupa, como comprova o resultado ao intervalo: 8-2. 

Na segunda parte os portistas mudaram a tática, isto é, passaram do contra-ataque ao ataque, apontando mais 5 tentos e eclipsando completamente as estrelas do Sporting, que eram na altura também alguns dos mais notáveis hoquistas portugueses, casos do guarda-redes Ramalhete (que teve uma noite para esquecer), de Chana (que de acordo com as palavras do jornalista de serviço, nem sei viu), ou de Sobrinho (que foi o menos mau dos lisboetas). A vitória não sofreu qualquer tipo de contestação, sendo que no final, o técnico António Livramento comarcaria por dizer que o «hóquei é um jogo de surpresas, onde tudo pode acontecer. Hoje o FC Porto esteve inspirado e nós tivemos uma noite infeliz. Com certeza que nem os próprios portistas pensavam alcançar tão alargado resultado. Aconteceu. Agora iremos tentar recuperar em Alvalade. Lá, senão conseguirmos a recuperação, terei a certeza de que, como aqui, perdemos de cabeça erguida», disse o lendário ex-jogador. E o trono deixado vago precisamente por Livramento enquanto melhor jogador português – e do Mundo, porque não? – estava prestes a ser ocupado por um jovem chamado Vítor Hugo, o tal número 4 portista que neste primeiro jogo abateu quase sozinho os poderosos leões. Questionado se o talentoso hoquista portista poderia ser o seu substituto enquanto estrela do hóquei, Livramento respondeu que de facto o atleta do FC Porto era «um jogador cheio de vontade e arte, eu conheço-o muito bem. Ele poderá vir a ser uma peça importante no nosso hóquei patinado». Quem teve uma noite horrível foi o titular da baliza do Sporting e da seleção nacional, António Ramalhete, que assumiu as suas culpas neste inesperado e avolumado resultado. «Penso que errei em alguns lances, pois encontro-me longe da minha melhor forma. Mas o último a falhar é sempre o mais notado. Um guarda-redes de hóquei em patins quando se coloca entre os postes não sabe se vai sofrer um, dois, ou dez golos. É imprevisível», disse, enquanto que também Chana lamentava a pesada derrota, ao mesmo tempo que mostrava esperança em mostrar uma outra cara em Alvalade no encontro da segunda mão: «Hoje o Sporting foi manifestamente infeliz e tudo lhe correu mal. Paciência. Em Alvalade iremos tentar retificar a imagem hoje criada»

Do lado dos vencedores vivia-se, naturalmente, um clima de alegria. O treinador portista, João de Brito, colocava um travão na euforia, dizendo que «o resultado não vai afetar a minha equipa e vou avisar os jogadores para não embandeirarem em arco, porque a eliminatória ainda não está ganha». A estrela da noite foi, como já vimos, Vítor Hugo, que à reportagem da Gazeta dos Desportos disse que aquele tinha sido um bom jogo e uma não menos boa vitória. 1982 tinha sido igualmente ano de Campeonato do Mundo, desta feita realizado em Barcelos, tendo o hoquista do FC Porto estado ausente da convocatória do selecionador nacional… António Livramento. No sentido de perceber se esta exibição havia sido digamos que um grito de revolta para com Livramento – quer acumulava também as funções de treinador do Sporting –, Vítor Hugo logo tratou de desmistificar essa ideia, referindo que em Barcelos a seleção não precisou dele, «e a prova é que se sagraram campeões do Mundo».

Ao Sporting não chegou sonhar... 

A segunda mão desta final realizou-se na Nave de Alvalade, onde o Sporting tinha uma missão quase impossível de reverter, como se viria a confirmar. Porém, os leões apresentaram uma outra atitude, tendo protagonizado um jogo que foi escaldante, equilibrado, mas com uma «previsível vitória global dos portistas», assim começou por escrever o jornalista da Gazeta encarregue de contar as incidências do encontro, José Carlos Freitas. O Sporting entrou de rompante no rinque, mas seria o FC Porto a gelar os cerca de 3000 espectadores presentes na Nave de Alvalade, quando correu desde a sua área até à baliza leonina ao longo de 15 metres para desferir um remate que seria desviado com êxito por Alves. O Sporting reagiu, deu a volta ao marcador, com golos de Trindade e Sobrinho, mas antes do intervalo os portistas assumiram o comando do jogo, e Vítor Hugo, Vítor Bruno (em duas ocasiões) e Vale bateram com êxito o guardião Ramalhete, dilatando assim ainda mais a folgada vantagem que traziam da primeira mão. Antes do descanso, Chana encurtou distâncias no marcador, mas a contenda estava mais do que a feição dos portistas que «aproveitando-se do balanceamento ofensivo do Sporting e da sua falta de rapidez, souberam aproveitar da melhor forma o contra-ataque, ao mesmo tempo que, quando de posse de bola, conseguiram enervar os adversários com constantes trocas de bola», assim analisou a primeira metade o jornalista José Carlos Freitas.

Porém, o Sporting melhorou a sua postura na segunda parte, ao passo que os portistas baixaram um pouco o seu ritmo, permitindo uma recuperação digna de registo dos lisboetas no marcador. No espaço de três minutos os homens da casa apontaram 3 golos que os colocaram não só na frente do marcador (6-5) como também fazendo os seus adeptos acreditar num possível milagre. Tal não viria a acontecer, já que o esforço acabou por ser inglório, tendo o FC Porto mantido até final a desvantagem de um golo num marcador que ficaria selado com 8-7 a favor dos sportinguistas, mas com um 20-12 no conjunto das duas mãos. «Com efeito, temos para nós que o mais importante nesta partida, para além da vitória do FC Porto no somatório geral, foi a confirmação dos seus jovens hoquistas como jogadores de primeira linha dentro do hóquei português e que podem vir a construir a base de uma futura seleção nacional» analisava em jeito de premunição o jornalista da Gazeta dos Desportos. E estava certo, porque não demoraria muito a vermos nomes como Vítor Bruno, Alves e um tal de Vítor Hugo a serem habituais chamadas à seleção das quinas. Sobretudo este último, que no total das duas mãos marcou 13 golos (9 nas Antas e 4 em Alvalade) a Ramalhete. A euforia tomou conta dos portistas no final do jogo, de tal maneira que até se esqueceram de ir receber a taça das mãos de Fernando Pereira, o português que então era o presidente da Comissão Europeia de Árbitros da CERS. Os portistas foram para o balneário festejar e só depois tiveram de voltar ao rinque para receber a taça, que seria entregue ao capitão Vale, perante o olhar da também portista Aurora Cunha, atleta que nesse dia se encontrava em Lisboa para participar nos Campeonatos Nacionais de Equipas em Atletismo e que foi a Alvalade apoiar o seu clube nesta primeira final europeia.

No rescaldo desta final, o treinador azul e branco, João de Brito, diria que este segundo jogo tinha sido muito bom, «em que estiveram frente a frentes duas das melhores equipas portuguesas que praticam um hóquei em patins de grande qualidade. (…) A nossa equipa veio a Alvalade para ganhar a eliminatória. Concordo que tivemos a vitória (neste segundo encontro) ao nosso alcance, mas no computo geral o que importava era a vitória na eliminatória e essa conseguimo-la por 8 golos de vantagem». Também a estrela desta final, Vítor Hugo, estava radiante, embora reconhecendo a eliminatória não «foi nada fácil. O Sporting é uma grande equipa. Ganhou o Campeonato Nacional e nós antes destes dois jogos tínhamos bastante medo do que pudesse acontecer devido à maior experiência dos seus jogadores. Mas depois, demonstrámos que a vitória foi merecida, porque estamos num melhor momento de forma que o Sporting e soubemos tirar o devido proveito». Do lado dos sportinguistas havia tristeza, cabeças baixas na hora de abandonar o rinque, entre elas a do treinador Livramento, que partiu para esta segunda mão com a confiança em alta. «Digo claramente que acreditava na recuperação. Foi por isso que trabalhámos uma semana inteira da forma como o fizemos. Quanto mais não fosse, tínhamos de ir lá para dentro e jogar o nosso melhor, e não para fazer figura de corpo presente e ver os jogadores do FC Porto patinar. Mas as coisas correram-nos mal de início, quando podíamos ter feito 2 ou 3 golos foi o FC Porto que se adiantou no marcador e a partir daí tudo ficou decidido. Perdemos a eliminatória no Porto, já nada se podia fazer agora», disse Livramento. A vitória na Taça das Taças foi não só a primeira gloria internacional alcançado pelo hóquei portista como também seria o primeiro de mais de 1300 títulos (em todas as modalidades do clube) conquistado por Pinto da Costa durante o seu reinado de mais de quatro décadas à frente dos destinos do clube da Cidade Invicta.  E por falar na maior cidade do norte do país, esta recebeu em festa os seus campeões após a epopeia de Alvalade, tendo centenas de adeptos azuis e brancos acorrido à Estação de Campanhã para receber os novos campeões da Taça das Taças.